Contrabando de Factos Históricos (Actualizado)

Mais um aniversário de Independência nacional passou. Foi no dia 25 de Junho, que se comemorou os 32 anos da nossa Independência Nacional. Foi no dia 25 de Junho de 1975 que o Estado português entregou o país aos moçambicanos, depois de aproximadamente 100 anos de colonização, se tomarmos como referência 1898, ano em que Mouzinho de Albuquerque deu por terminado as campanhas de pacificação, com a derrocada do Império de Gaza (1895-6) e os xeicados do norte de Moçambique, marcando assim o início de uma administração efectiva do estado Português sobre o território de Moçambique, como mandavam os ditames de Berlim.
Coincide porém que, no mesmo dia, mas há 45 anos, em Dar-es-Salaam, formava-se um movimento de Libertação de Moçambique, que mais tarde viria ser conhecido por FRELIMO, portanto, Frente de Libertação de Moçambique, fruto de uma união de três movimentos, nomeadamente MANU, UNAMI e UDENAMO bem como adesão de outros indivíduos, mais tarde tidos como heróis nacionais, como Eduardo Mondlane, Marcelino dos Santos, Samora Machel, etc.
No dia 25 de Junho de 2007 o Partido Frelimo comemorava mais um aniversário da sua existência. Segundo seus membros dirigentes, era o seu quadragésimo quinto aniversário, tendo em conta o ano de 1962 como data da sua "fundação".
Sem querer contrariar as contas do partidão, parece-me útil e oportuno interpelar o contrabando que se pretende viabilizar aqui. Trata-se de um contrabando de factos históricos. Esse contrabando, se não for desmantelado, corre o risco de distorcer a memória de muitos de nós, e quiçá a das gerações vindouras. A Frelimo, essa que festejou em Chamanculo, (um bairro maputense muito populoso e pobre ao mesmo tempo) os 45 anos da "sua existência", é de facto, uma pessoa jurídica, de direito próprio que nasceu NÃO em 1962 mas a 7 de Fevereiro de 1977 em Inhambane, Praia do Tofo, altura em que se transformou em PARTIDO; altura também que decidiu seguir uma linha ideológica que se pretendia marxista (coitado dele, Marx, mal interpretado) e leninista (pior, este Lênin é que deveria ser punido por fazer uma interpretação errónea e até cientificamente criminosa de Marx).
Foi a 7 de Fevereiro de 1977
, que a Frelimo chamou a si o direito de se constituir guia do povo moçambicano e partido da vanguarda tendo, por essa via limitado a possibilidade da existência de outros partidos políticos, muito menos vozes contrárias ao regime. Aparentemente, todos tinham a liberdade de expressão e de opinião, mas dentro de uma senha: unidade-crítica-unidade, ou seja, “podias falar, mas no fim permanecia a verdade”, essa que Hegel sempre a pôs do lado do Estado, neste caso, Partido-Estado.
O Partido Frelimo, completou portanto, trinta anos de existência (30 anos) e não 45 como se quis propalar. Há fontes que podem sustentar o que digo. Basta consultar os Estatutos e as decisões do III Congresso da Frelimo (que curiosamente não aparecem no seu portal), Os Boletins da República de então (1977) bem como os seus estatutos que, por força da lei, deverão estar depositados no Ministério da Justiça e ainda a lei dos Partidos Políticos de 1991.
Porque alguns desses documentos não estão ao alcance de todos, eu gostaria aqui e agora, partilhar convosco um Diploma Ministerial que pode nos ajudar a compreender o que tento sustentar aqui: a ideia de que os 45 anos que o Partido Frelimo diz ter, é, na verdade, falsa.
Trata-se do DIPLOMA MINISTERIAL 70/86 de 24 de Dezembro, publicado no Boletim da República número 52, Primeira Série
Diploma Ministerial 70/86, (BR n.º 52 I Série). Aqui, lê-se o seguinte:
Considerando o disposto nos artigos 9 e 11 do decreto presidencial 34/86, de 24 de Abril;
Sob proposta do Director Geral dos Correios de Moçambique determino:
É emitida e posta em circulação, cumulativamente com as que se acham em vigor, uma emissão de selos comemorativa do “DÉCIMO ANIVERSÁRIO DA CRIAÇÃO DO PARTIDO FRELIMO”, com as seguintes características....
Assinatura
Vice Ministro dos Transportes e Comunicações
Sr. Jorge Gomes Lousã.
Assinado a 02 de Dezembro de 1986

Portanto, pode-se a partir daqui, compreendermos o seguinte:
1. A Frelimo, completaria DEZ ANOS em 1987. Doutra maneira não podia ser. É que os selos comemorativos foram emitidos em Dezembro para serem usados no ano seguinte, portanto, 1987.
2. Está neste caso, implícita a verdade de que o Partido Frelimo, pelo menos até 1986 não tinha perdido a conta da sua idade. Sabia que no anos seguinte iria completar os dez anos da sua existência. Umas simples contas levam-nos ao ano de 1977 como sendo o ano em que o partido Frelimo nasceu.
3. Se quisermos ainda esticar a corda, diríamos que o Partido Frelimo não nasceu em Junho mas sim a 07 de Fevereiro de 1977 pois, foi nesta data que ela se transformou de Frente de Libertação de todos nós para PARTIDO de alguns, como o próprio termo (partido) sugere.

O contrabando que deve parar
Referi-me há pouco que o facto de o partido Frelimo obliterar o sete de Fevereiro de 1977 como sendo a data da sua criação e preferir 25 de Junho de 1962 constituía, na minha óptica um contrabando de facto históricos. Explico a seguir os porquês:
1 Ao não diferenciar Frelimo como Partido da Frelimo como Frente de luta que libertou o país, fruto da vontade de todos moçambicanos unidos; ela acaba abocanhando (e por essa via privatizando) parte da História de todos nós. De todos aqueles que não se identificam com o actual Partido bem como seu projecto de sociedade. Na verdade, a libertação do país foi obra de todos nós. E nunca de um grupo de pessoas ou partido. Tanto os guerrilheiros na frente de combate como os colaboradores vivendo em aldeias, vilas e cidades, sofriam e lutavam contra o regime colonial.
2 Ao deliberadamente usar a data 25 de Junho como sendo a data da Fundação do Partido Frelimo (curioso aqui é notar que o discurso do Partido Frelimo poucas vezes faz questão de esclarecer que ela é Partido Frelimo e não A FRELIMO-querendo implicitamente recordar-nos dos dez anos de luta pela libertação do pais) ela quer dar a nossa esfera pública a ideia de que é o Partido mais antigo, e por isso experiente e digno para governar o país; mais maduro, mais nacionalista e patriótico. Esses todos atributos acabam pesando no discurso do dia-a-dia dalguns membros da Frelimo que insistem na ideia de que “É UM IMPERATIVO NACIONAL QUE A FRELIMO GANHE...para o bem da nação” (sobre as consequências de tais afirmações..já se sabe). Até que posso concordar que ela seja mais experiente e organizado, com mais meios e uma agenda coerente.
3 A Frelimo também deve ter feito algumas contas bem interessantes. É que se ela aceitasse que nasceu em 1977, Fevereiro, então deixaria de ser o partido mais antigo. A FUMO de Domingos Arouca, nasceu em 1976 em Portugal. Assim, teríamos a FUMO como o Partido Político mais antigo de Moçambique. A Renamo, como movimento armado nasceu igualmente em 1976, apesar da sua transformação para Partido Político ter ocorrido a partir de 1992 com a assinatura dos Acordos Gerais da PAZ. E isso em nada agradaria o nosso partido.

PS: ACTUALIZAÇÃO:
Apesar de este artigo não ser objecto de muitos comentários, como era de esperar, é curioso notar que recebo directamente da minha caixa de mensagens do telemóvel e email reacções muito interessantes. Aliás, importantes.
Mas a mais importante veio de uma figura bastante conhecida que, por razões óbvias não quis que o revelasse. Ele alertou-me à um "contrabando dos factos" que eu próprio estava a encetar. Na verdade, o III Congresso da Frelimo não teve lugar no Tofo, Inhambane, como dissera. Este teve lugar na mesma data e mês em Maputo, no Clube Miliatr.
Quanto a Reunião do Tofo, ele diz que tratou-se de um encontro especial do Comité Central da Frelimo, em 1975, que aprovou a Primeira Constituição da república Popular da Frelimo. ou seja:
Primeiro: Samora Machel realiza no Tofo uma reunião especial do Comité Central da FRELIMO em 1975, durante a sua viagem "Do Rovuma ao Maputo". Esta reunião é considerada especial por ter aprovado a primeira Constituição de Moçambique, mas não alterou a organização da FRELIMO, que continuou como uma Frente;
Segundo: Em Fevereiro de 1977, após a proclamação da Independência Nacional, a FRELIMO (Frente) realiza o seu 3º Congresso no Clube Militar em Maputo, no qual a Frente se transforma no Partido Marxista Leninista Frelimo.

Comentários

Laurentina disse…
BOA MALHA EGÍDIDEO...ADOREI A EXPOSIÇÃO DOS FACTOS E A TENTATIVA DE ESCLARECER OS INCAUTOS SOBRE AS VERDADES HISTÓRICAS A QUE NÃO PODEMOS FUGIR...
DÁ-LHES QUE AINDA MEXEM ...ELE HÁ GAJOS QUE PENSAM QUE ANDAMOS A DORMIR NA FORMA!!!

BOM FIM DE SEMANA
BEIJÃO GRANDE PARA TI
Anónimo disse…
Vaz, Fico feliz por saber que entraste neste debate! Penso que chegou o momento de darmos um chega a estas tentativas de alguns politicos quererem escamotear a verdade historica.

Entao dr Vaz, Nesta tua ideia de pensamento podemos concluir que: 1. Este ano a Frelimo (Partido) nao celebrou o seu Nono Congresso mas, o Setimo? Isto porque em 1977 foi celebrado o Terceiro Congresso da FRELIMO (Frente). Assim, devia ser o Primeiro da Frelimo (Partido)?
Sergio Vip
Egidio Vaz disse…
Obrigado Laurentina.
Sérgio Vip.
Acertaste em cheio. Há de facto muitos factos que precisam ser exorcisados.
Mas, o tempo dirá.Um abraço.
Anónimo disse…
Assim é que é, ilustre. Precisamos de falar destas coisas em público, e não somente na sala de aulas.
Abraços de Ericino
Egidio Vaz disse…
Muito obrigado pela parte que me toca.
chapa100 disse…
egidio, os desafios da historia de mocambique é complexa. so voces historiadores podem ajudar com vossa ciencia nesta tarefa dificil de registar a historia.
Egidio Vaz disse…
De há alguma tempo a esta parte, tenho estado a pensar que na verdade, há muita coisa que ficou por dizer, interpelar e questionar. Por exemplo, o Discurso da proclamação da Independência proferido por Samora Machel a 25 de Junho de 1975:
A dado passo, diz que "O Comité Central da Frelimo proclama solenemente a Independência TOTAL E COMPLETA de Moçambique e a sua constituição em República Popular de Moçambique..."
Prestem atenção às palavras "TOTAL E COMPLETA de Moçambique".
1.O que significava isto?
2.O que estava a passar pela cabeça dos seus redactores, quando sabia-se que a Frelimo herdava um país com mais de 60 porcento de analfabetos; uma indústria quase desfalecida; um sistema de transportes que apenas servia o hinterland e uma rede sanitária inexistente?
3. Pior, para cinco anos mais tarde declarar a década de 80 como década de vitória sobre o subdesenvolvimento, mas antes, 1977 começarmos a ouvir aquela fórmula de fecho dos discursos: A LUTA CONTINUA! (Contra o subdesenvolvimento e contra os regimes racistas e do apartheid).
Perguntando, quando é que Moçambique ganhou a sua Independência total e completa?
Anónimo disse…
Todo Mocambicano sabe que a historia verdadeira de Mocambique, esta escondida. temos um governo que pensa que o seu pove e idiota, mas e vergonha porque o povo ja esta educado mas os do governo e que nao sao educados.

Todo Mocambicano e frelimo nao esta de hoje que se diz que e que faz mas aquela que se formou pela uniao de todos Mocambicanos de Rovuma ao Maputo. Nos sabemos muito bem quem foram os nossos patriarcas, nao se fla de Reverento Simango nem Nkavandame. veja na wikipedia ade ver os factos reias faca pesquisas. e pena ne! mas a historia verdadeira de Mocambique vai sobresair havera uma outra revolucao de desmantelamento das mentira e exposicao das verdades e todo metiroso ficara nu.
forca, nao quero me idenfiticar mas estou contigo. Forca amigo

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