Pegar o boi pelos cornos: contra a apatia e o cinismo
A crítica sem a prática superadora correspondente leva à inacção, ao
pessimismo, à desmobilização e no limite, à desmoralização. As análises que não
desembocam nessa direcção superadora tendem a se manter em visões descritivas
ariscando assim a sua eficácia. A maioria das análises críticas que tenho lido
por aqui destacam aspectos da realidade e absolutiza-os, tirando-os do
contexto; não dão conta da totalidade do fenómeno. Este tipo de crítica não
capta as contradições vivas da realidade, não remete à prática, enfim, resigna-se
a uma visão externa ao objecto analisado.
Vivemos actualmente à sombra do vocabulário maoísta. Mas é importante que
para além deste vocabulário e de palavras de ordem esforcemo-nos para encontrar
saídas sustentáveis aos problemas que Moçambique hoje vive.
Um crítica que se pretende superadora ocupa-se da limpeza do campo de
concepções que reflectem de forma parcial ou completamente equivocada a
realidade, não para deter-se aí, mas para incorporar seus elementos de verdade,
negá-los nas suas inverdades e poder, assim, estar em condições de superá-las
(Emir Sader, 2007).
No momento conturbado como o nosso, vejo várias correntes fazendo apanágio a
revolução, insinuando na necessidade de retirar o poder instituído e substituí-lo
por um outro. Não estando claro sobre os mecanismos necessários para este
desiderato, muito menos sobre a opção – se é para recriarmos o jacobinismo na
sua forma atávica ou uma revolução do proletariado – tudo indica que para nos próximos
vinte anos, o partidarismo continuará o cerne do sistema político moçambicano. Ou
seja, toda a revolução passará necessariamente pela alternância do poder por
via de partidos políticos.
Ora, parece-me aqui onde todo jovem crítico deve por hora concentrar as
suas atenções e esforços caso o interesse seja mudar as coisas para melhor:
sejam eles da FRELIMO, RENAMO, MDM ou parecido, é sobre os partidos políticos que
se deve incidir a mudança, e não no abstracto.
O que se sabe da Renamo? O que se sabe do MDM? O que se sabe da FRELIMO? O que
se pretende que se mude nestes partidos políticos? Que tipo de relações de convivência
política seria desejável ver entre estes? O que está a faltar para que o debate
político flua? Como contornar a exclusão política e como destrincheirar a falta
do diálogo?
Quando criticamos a Frelimo pela sua corrupção, cleptocracia e falta do
diálogo, será que estamos seguros que a Renamo é o oposto? Quando falamos da falta
de prestação de contas ao público e desrespeito pelos cidadãos da Frelimo,
temos a certeza que o MDM oferece-nos garantias que isto não acontecerá quando tomar
o poder? Enfim, como tornar os partidos políticos mais transparentes e
prestadores de contas mesmo antes que estes alcancem o poder de Estado?
As perguntas que fiz não são para desmoralizar quem quer que seja. São para
ajudar a criar em nós uma consciência política capaz de entendermos que a possibilidade
de influenciar os processos políticos reside na nossa capacidade de mudar os
processos dentro dos partidos políticos. É aqui onde reside o nosso problema
como cidadãos.
A população moçambicana é regra geral politicamente “desengajada” ou seja,
politicamente inactiva. Isto não quer dizer que não tenham a consciência política.
A soma de membros da FRELIMO, RENAMO, MDM, PDD e outros não perfaz se quer
25% da população em idade eleitoral em Moçambique.
Em Moçambique, a melhor forma de ser-se “académico” é não se envolvendo em
actividades politicas (a não ser que sejam da Frelimo por causa das óbvias vantagens)
ou seja, um apelo anacrónico a neutralidade. Em simples palavras, temos
partidos políticos sem membros e os que são, são inactivos. O resultado disto é
o domínio das direcções partidárias sobre os órgãos e em última análise, sobre
os órgãos dos partidos políticos, asfixiando assim a democracia interna. A competição
endopartidária morre. A liberdade de expressão e de pensamento morre e
fortalece-se um tipo carismático de liderança.
Eu não vejo mudança séria sem a participação dos moçambicanos em partidos políticos.
Não vejo mudança política sem o engajamento desejável dos jovens na discussão de
soluções de problemas dentro da política. Ou seja, pegar o boi pelos cornos.
Mas para isso é preciso coragem; é preciso sair a rua e ser contado. Sair a
rua e dizer eu sou do MDM, da RENAMO, da FRELIMO; trabalhar para mobilizar os
outros a aderirem ao partido; a participar dentro dos órgãos a discutir estratégias,
etc. Porque é dos partidos políticos que saem o Guebuza que não queremos; o
Dhlakama que nos mata; o Daviz Simango; o Ismael Mussa etc.
Só podemos ter o dirigente que precisamos se (1) se for pertencente a um
partido; (2) for eleito dentro dos órgãos como candidato e (3) se ganhar em eleições.
E isto só é possível se (a) engajarmos e militarmos dentro destes movimento,
(b) participarmos activamente no recrutamento de outros membros que julgamos estratégicos
para responder aos desafios políticos e (c) fizermos eleger os que julgamos
aptos para as tarefas em cada momento da vida política deste país.
Para finalizar, importa recordar:
1.
Apenas
menos de 30% da população Moçambicana é quem de facto manda neste país. São estes
que, pertencendo a partidos políticos, votam em seus representantes em fóruns partidários
e depois apresenta-os a “grande população” para as posições de direcção nacional.
2.
Mudar
isto implica no engajamento massivo dos restantes 70% da população em processos
políticos directos, onde os líderes são eleitos e as politicas traçadas e
apresentadas.
3.
Por
mais vociferantes que sejam em Moçambique, a “sociedade civil”, ou organizações
da sociedade civil não serão capazes de mudar o curso deste país. Este país
muda com pessoas concretas, engajadas na política. As manifestações do Egipto, Ucrânia
ou Tunísia, tinham rosto e direcção concretos.
4.
Nem cartas-abertas;
nem passeatas “pacíficas” muito menos a promoção do Moçambique-sentado” conseguirão
mudar o curso do país.
5.
A mudança
prepara-se; a mudança organiza-se; parafraseando o lema da FRELIMO. Ao mesmo
tempo que reclamamos dos malefícios de Guebuza, urge purgar, limar e concertar
as incoerências dos que queremos ver no topo da liderança agora. Isto aplica-se tanto na FRELIMO como no MDM e
Renamo. O facto de estes nunca terem provado o poder não os coloca em posição de
imaculados. O tempo de direcção que têm é suficiente para se lhe lançar as mãos.
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