PRAÇA DOS HERÓIS NÃO É CEMITÉRIO!
A última vez que escrevi sobre isto foi há três anos atrás. E hoje volto a insistir.
A Praça dos Heróis Nacionais é o local onde se celebram as efemérides mais importantes do País. É o ponto mais importante e mais alto de todas as cerimónias oficiais de carácter histórico-cultural do nosso país.
Nos 40 anos da nossa independência, a Praça tem recebido os filhos mais nobres deste país: tanto vivos como mortos, sendo os vivos em visita dos mortos. É lá onde repousam maior número dos heróis nacionais. Samora e Mondlane foram primeiro lá e depois seguiram para as suas terrais natais. [Mondlane foi antes enterrado em Tanzânia e depois seus restos mortais transladados a Maputo].
Agora que o Tenente-general José Moiane faleceu, foi declarado Herói e para lá foram seus restos mortais repousar.
EU NÃO CONCORDO COM O TRATAMENTO QUE A PRAÇA DOS HERÓIS ESTÁ A TER POR PARTE DO ESTADO MOÇAMBICANO.
A Praça dos Heróis não deve necessariamente ser um cemitério, para começar. A Praça dos Heróis deve ser um monumento erguido em reconhecimento dos heróis de uma determinada nação em torno do qual deve conter TODOS os elementos materiais e não materiais que documentam a história, a importância e o legado de quem se homenageia. Portanto, a Praça dos Heróis não é e nem deve ser cemitério.
A melhor forma de honrar os nossos heróis é não pô-las ou depositá-las dentro da cidade ou dentro das nossas casas. É colocando-os num espaço destacado onde podem descansar em paz eternamente. Isto sim, é respeito.
Em outros países - e é assim como acontece - uma Praça dos Heróis é normalmente um espaço público, acessível por todos, seja mediante o pagamento de uma quantia pecuniária seja de livre acesso, para aprendizagem e inspiração. Guias turísticos, expedições científicas e grupos de visita com vários interesses escalam este local para aprender, inspirar-se e saber um pouco da história de um povo. Uma praça dos heróis seria também um local onde fosse possível adquirir réplicas de objectos históricos ou insígnias dos que ora se homenageia, como bandeirolas, cachecóis, bonés, camisetas, livros, agendas, garrafas, casacos, medalhas, postais, etc., de pessoas honradas de uma nação ou do seu legado.
Ou seja, em vez de ser um cemitério, evitado e vigiado 24 sobre 24 horas, uma praça dos heróis devia ser um ponto de atração turística, onde a cada dia 3 de Fevereiro ou data histórica , pudéssemos levar nossos filhos para visitá-la e revisitar a história de um povo; a nossa história de Moçambique.
Fazendo-a um verdadeiro cemitério como é o caso, faz sentido que seja inacessível. Nem ao muro de João Craveirinha se deve fotografar. É óbvio; num cemitério como aquele, onde repousam pessoas mortas, protege-lo contra a profanação é uma prioridade, infelizmente.
Eu sou de opinião que se deve encontrar um espaço; o Município de Maputo e da Matola, ou qualquer outro deste país, deve encontrar um espaço bom, acessível e nobre para criar um cemitério de dirigentes, se assim quiserem, para onde todos eles deverão encontrar a ultima moradia. Nos EUA, Grã-Bretanha etc., existem este tipo de cemitérios, que são também eles próprios locais de atração turística. Arlington National Cemitery, na Virgínia, EUA, é um exemplo.
É que eu estou cansado daquele cemitério familiar dentro da Cidade: Tem ar pesado, melancólico e muito supersticioso. É pouco usado, pouco útil para a maioria da população e não rentável nem do ponto de vista financeiro, muito menos do ponto de vista cultural e educacional. É dos poucos espaços públicos desdenhados por más razões.
E porque ele é apenas acessível em dias históricos e por um grupo eleito, a Praça dos Heróis acaba não sendo nem servindo a sua função de património nacional, de todos nós, para assumir um carácter privado e familiar; um cemitério dos eleitos e paradoxalmente sustentado pelos cofres do Estado.
Urge um debate nacional sobre a pertinência em mantermos cemitérios familiares e elitistas dentro da cidade. Entre encontrar um espaço nobre e fora da cidade, devidamente apetrechado para colher e acomodar os heróis nacionais; os melhores filhos da pátria moçambicana e mantermos os nossos heróis naquela praça barulhenta e alva sistemática de acidentes de viação [entre embates contra muros por pessoas bêbadas etc.], eu prefiro a primeira opção, com a vantagem de que pensando em transforma-la numa verdadeira referencia história, de aprendizagem e de inspiração nacional, acessível por todos e por todos respeitada.
E com esta provocação vem todo o debate sobre a valorização do nosso património material e imaterial da nação moçambicana.
PS: Espero também que brevemente a senhora Marlene Magaia, curadora do Museu dos Presidentes abra ao público as galerias para a exposição. Eu também quero lá entrar para aprender e investigar.
PS1: Em Junho de 1991, Sebastião Marcos Mabote, Madjendje, José Moiane, Manuel António foram presos sob acusação de tentativa de golpe de Estado liderado pelo General Sebastião Mabote (Chris Alden & Mark Simpson, 1993:109-130). Porém, o Juíz de causa, o Dr Alberto Santos Nkutumula também Juiz do processo relativo ao roubo de motores de aviões militares e outro equipamento destinado a uma frustrada operação de tráfico ilegal de armas (Augusto Raúl Paulino, 2003; 11) foi barbaramente assassinado juntamente com a esposa e sua viatura queimada. Tempos depois todos teriam sido absolvidos por falta de provas.
PS2: Eu não concordo que o Tenente-general José Moiane seja Herói Nacional. Ele foi sim um dos melhores estrategas militares do país, desde a independência nacional, que se dedicou à causa. Mas isto não lhe dá o mérito para estar no mesmo pedestal do Mondlane, Samora ou Craveirinha.
PS3: O título honorífico de Herói nacional DEVE ser indubitável. Quero neste momento reconhecer e me curvar perante o Tenente-geenral José Moiane pelos serviços prestados à nação, ao mesmo tempo que exorto à necessidade de o Presidente da República usar com parcimónia e sapiência a atribuição de futuros títulos honoríficos para que este não seja esvaziado do simbolismo que cintila no imaginário popular.
Estou a dizer por outras palavras, lançando um vibrante desafio à necessidade de investigarmos, documentarmos e divulgarmos a história dos actores e fautores da História de Moçambique o mais profunda e amplamente possível para que não seja surpresa quando o próximo morrer e lhe for atribuído um título honorífico e uma meia página de louvores em relação aos seus feitos.
Porque isto deixa a percepção de que o Presidente da República está a usar o seu poder discricionário para também distribuir favores póstumos, condecorando pessoas conhecidas em pleno estado de choque, da emoção, da consternação e da melancolia.
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