DESCENTRALIZAÇÃO: pensar para além das balas
Estão o
governo e a Renamo a discutir a descentralização, no âmbito do diálogo de busca
de uma chamada Paz Efectiva. Reflecti sobre a proposta da Renamo e o que trago
não é tão bom assim. A conclusão a que cheguei é de que o processo é longo,
será longo, até alcançarmos um ponto de equilíbrio. Para recordar, a Renamo, na
pessoa do seu líder propõe (mas ele exige) que os governadores sejam eleitos e
estes sejam autónomos na sua governação.
Olhei
para a constituição e só vi um pandemónio em formação. Eis as minhas questões.
1.
Constitucionalmente
o Presidente da República é o chefe do governo e do estado. De recordar que o
nosso país é de um presidencialismo reforçado.
2.
Os
governadores são nomeados e exonerados pelo Presidente da República.
3.
Abaixo
dos governadores estão os administradores, também estes, representantes do
chefe do estado ao nível distrital.
4.
Os
directores provinciais vivem uma dupla subordinação camuflada. Obedecem o governo
provincial, mas também ao ministro do pelouro. Nomeado pelo Ministro do
pelouro, mas dependente do governo provincial na sua actuação. É o governador
que em última análise, coordena, condena e descoordena a acção governativa ao
nível provincial, inclusive manda nos administradores.
Na eventualidade de os governadores serem eleitos, estes terão também que
nomear directores provinciais, administradores etc.? Em caso afirmativo, então
a ideia inicial de províncias autónomas de Dhlakama fica realizada. Mesmo assim
e antes disso, uma emenda constitucional será necessária para isto ter lugar.
De uma ou de outra forma, estamos perante um dilema constitucional sem
precedentes. Será necessário pensar para além das balas e ver como um país com
características como nossa pode sobreviver num estado federalista. Este país é
ainda pobre. Nem o federalismo pode nos salvar rapidamente da nossa condição.
Ao contrário do que alguns pensam, nenhuma província pode hoje sobreviver
sozinha. Nem Tete, nem Cabo-delgado ou Maputo-cidade. E porque precisam-se
mutuamente para combater as discrepâncias regionais, não me parece que a ideia
seja uma boa proposta.
ALTERNATIVA
Para além do debate que corre, precisamos perceber a ideia de Dhlakama. Ele
e os seus querem que nenhum partido governe sozinho e que cada um tire proveito
do seu peso político na sociedade, a cada eleições.
Ora, se esse é o princípio, então, o caminho mais rápido e simples é TORNAR
TODAS CAPITAIS DISTRITAIS EM MUNICÍPIOS – essa ideia não é nova. Já tinha sido
proposta pelo MDM. Tem seus custos mas é mais fácil e rápido do que a
federalização que se pretende. Com a municipalização é mais fácil a Renamo
acomodar maior número de simpatizantes, ganhar mais sedes distritais e
participar activamente nos processos de governação. O desenvolvimento pode
acontecer rápido do que com a federalização.
Alternativamente, não deverá nenhum governador ser eleito individualmente.
Pelo contrário, era de sugerir que fosse votado em sede da Assembleia Provincial
e empossado pelo Presidente da República. Mas tinha que cumprir o programa do
governo do partido vencedor. A acontecer dessa forma, a Renamo não terá ganho
quase nada pois ela continuará sem expressão concreta no terreno.
Fazer eleger individualmente governadores de província levanta problemas
constitucionais que, a ter que sermos coerentes, implicará numa reforma
constitucional profunda. E se formos por ai, então, é melhor esperarmos
sentados. O trabalho é longo. E a paciência vai ter que vir tanto de Dhlakama e
seu partido como da sociedade em geral.
PS: É tempo de a Renamo também começar a pensar de outra forma. Não pode
ela querer ganhar mesmo perdendo, ou perdendo, mesmo ganhando. Ou seja, deve
pensar no melhor modelo possível de descentralização para o país, ponderados
todos os aspectos positivos e negativos. O que venho notando é que ela sempre
pensa nela e nos seus. GOVERNAR ONDE GANHOU não deve ser um princípio em si se
tal não for benéfico para o país como um todo. Por isso que é importante
discutirmos não em função do calor das balas mas em função do que é melhor para
o país. Vamos discutir/debater?
Comentários